Peito!
- Liah Santana
- 1 de mar. de 2018
- 2 min de leitura
Tudo que veio depois foi um reflexo tão grande daquela tarde que nem consigo explicar, porém posso tentar. Eu estava muito bem na minha ilusão de criança feliz, com pouco mais de dez anos, acho, quando num dia qualquer desci para brincar. Todos em volta do gira-gira rindo e falando de diversos assuntos, eu me sentindo a menina mais foda do mundo por ser a única no meio de tantos garotos. Resolveram fazer uma brincadeira de mal gosto com meu amigo (e paixão platônica) girando ele sem parar nem deixá-lo descer. Eu devia ter feito algo, mas dei um sorriso amarelo e só ajudei quando o deixaram sair. Foi ai que veio o momento decisivo que eu iria me lembrar por anos. Ele olhou nos meus olhos e gritou: "Você é uma despeitada!". Todos riram muito, olhando para mim, e comecei a ficar envergonhada, mas então ele completou:" Não riam pois vocês não entenderam! Eu não estou falando dos seios dela, estou falando da falta de caráter, da falta de peito para enfrentar a vida! Eu esperava mais de você.".
Já mudei muito com os anos. Vieram as curvas e seios não tão fartos mas suficientes para uma autoestima renovada. A questão é que aquele tal peito nunca chegou. Passaram-se quase uma década e nunca tive a força para mostrar a que vim, pois o ímpeto de se impor quando soube que deveria não cresceu na puberdade. Os hormônios que fizeram minhas mamas aumentarem talvez só tenham deixado pior o meu medo de me expor ao julgamento alheio. Afinal, o que aquela pequena menina achava legal em ser única e " mais descolada", na vida adulta se tornou a procura por uma voz num mundo em que a boca feminina só é aceita se fechada, obediente, pintada sorridente mas nunca quando usada para defender o que a gente sabe ser o real motivo da vida: o conhecimento.




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